sexta-feira, 16 de maio de 2008

O DESAFIO DA PROMOÇÃO DO VOLUNTARIADO EM TORNO DE UMA CAUSA

Vamos continuar comentando os desafios (colocados no artigo OS GRANDES DESAFIOS DA SUSTENTABILIDADE EMPRESARIAL) para as empresas neste início do século 21: induzir o desenvolvimento (da empresa e do meio em que a empresa atua, elaborando, articulando e executando programas de sustentabilidade); fazer a gestão democrática da rede dos seus stakeholders (iniciando a transição do seu padrão de organização – de mainframe para network – e democratizando progressivamente seus procedimentos internos e externos); promover o voluntariado em torno de uma causa; e, exercer de uma nova maneira a sua responsabilidade social e assumir a sua responsabilidade política.

Neste artigo vamos abordar o terceiro desafio: a promoção do voluntariado em torno de uma causa.

Com relação a esse terceiro desafio, temos também um conjunto de questões práticas: como rever as definições estratégicas básicas da empresa à luz das novas exigências de sustentabilidade, reformulando com clareza os seus valores centrais e o seu objetivo? Como definir a causa da empresa? E como promover o voluntariado dentro e fora da empresa em torno da sua causa? Essas são as questões-chave.

No entanto, existem perguntas que deveriam ser respondidas primeiro. Por que razão a empresa deve ter uma causa? Não basta a sua visão, a sua missão, os seus valores? E por que se diz que a empresa deve promover o voluntariado (interna e externamente)?

Um dos principais elementos do capital humano é a capacidade que as pessoas têm de fazer coisas novas, exercitando a sua imaginação criadora – o seu desejo, sonho e visão – e se mobilizando para adquirir os conhecimentos necessários, capazes de permitir a materialização do desejo, a realização do sonho e a viabilização da visão. Ora, isso tem um nome: chama-se ‘empreendedorismo’. Portanto, para ter um ambiente interno favorável ao desenvolvimento, a empresa precisa ter, em primeiro lugar, um ambiente favorável à inovação. Mas um ambiente favorável à inovação depende de fatores internos e externos. Os fatores internos favoráveis à inovação dependem da liberdade para criar e da ousadia de inventar, o que é função, por sua vez, da cultura empreendedora da empresa.

A empresa é mais do que a soma das pessoas que a constituem e que se relacionam com ela. A empresa é uma realidade social e não apenas multipessoal. Isso significa que a empresa não depende apenas do fator humano, mas também do fator social. E isso significa que um ambiente interno favorável ao desenvolvimento, além de ser função do capital humano, é também função do capital social.

Do ponto de vista do capital social, a criação de um ambiente interno favorável ao desenvolvimento da empresa depende da maneira como as pessoas convivem – as emoções e as razões (extra-econômicas) pelas quais permanecem juntas naquela empresa. E depende da forma como essas pessoas se relacionam, regulam seus conflitos e se conduzem coletivamente.

Uma empresa capaz de se desenvolver existe como tal na medida em que as pessoas que a constituem tenham um propósito convergente, compartilhem valores e crenças e formem algum consenso em torno de objetivos e metas. Além disso, uma empresa capaz de se desenvolver existe na medida em que as pessoas nela envolvidas tenham uma causa.

A cooperação, que faz as pessoas permanecerem juntas em uma mesma empresa, além do salário que recebem ou do lucro que auferem, não pode se instalar, se ampliar e se reproduzir na empresa como um todo se as pessoas se relacionam apenas de maneira vertical, piramidal, em uma cadeia de subordinação, cada uma sempre dependendo de outra para fazer qualquer coisa. Padrão vertical de organização, subordinação e dependência, impedem a geração, a acumulação e a reprodução do capital social. Para que o capital social possa ser gerado, acumulado e reproduzido, é necessário que as pessoas se conectem, umas com as outras, segundo um padrão horizontal de organização – ou seja, em rede distribuída –, que não sejam em tudo sempre subordinadas umas às outras e que sejam interdependentes em vez de dependentes.

A conectividade horizontal, combinada com a interdependência, leva as pessoas a estabelecerem relações de parceria entre si, em vez de ficarem o tempo todo possuídas pela preocupação de "quem vai mandar em quem". Conectividade horizontal e interdependência conduzem à autonomia das pessoas e não à subordinação. Além disso, para haver cooperação, é necessário que as pessoas compartilhem valores e objetivos comuns, ou seja, que tenham um projeto comum. Não se pode criar um clima interno favorável ao desenvolvimento se as pessoas não participam voluntariamente de ações conjuntas. E isso elas só farão na medida em que compreendam que estão compartilhando uma causa.

A causa é absolutamente necessária e ela não se confunde com a visão, a missão e os valores da empresa que geralmente são formulados em qualquer exercício de planejamento estratégico. A causa não tem a ver com o que você faz porque é funcionário da empresa e sim com o que você faz voluntariamente, porque quer fazer, porque acha bacana. Ela não é definida a partir da racionalidade do negócio da empresa e sim a partir da maneira particular, peculiar, única, como a empresa quer se dedicar àquele determinado negócio e, ao mesmo tempo, atingir um objetivo maior.

Não se trata de emular empregados e sim de contar com a sua cooperação voluntária – como parceiros da causa, como agentes da causa que sairão pelo mundo contaminando mais gente, conquistando mais voluntários.

Até hoje muitas empresas trabalharam esse tema com uma visão míope. Imaginaram que visão, missão e valores deveriam ser definidos para dar coesão a um contingente de agentes produtivos, para que eles produzissem mais e melhor, reclamassem menos, em alguns casos até abrissem mão de seus interesses pessoais em nome do bom funcionamento da empresa.

É preciso, muito além disso (e em vez disso), despertar aquele espírito do voluntariado que é capaz de mover montanhas. Com efeito, não há nada que produza capital social em maior quantidade do que o trabalho voluntário, movido por uma emocionalidade cooperativa, quando se transforma, para usar uma expressão de Robert Putnam, em um “hábito do coração”.

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